Desde criancinha sonhava em ser faixa preta, em meus
delírios, ao assistir as produções hollywoodianas de artes marciais, gerava
minhas ambições de ser um excepcional artista da arte da guerra.
Nunca cogitei que as minhas limitações físicas, relacionadas
a minha deficiência física me impediriam de realizar meu sonho.
Quando me matriculei na primeira
academia de karatê, o sensei também não me disse nada em relação as minhas
limitações, apenas me tratou como qualquer outro aluno.
Com o decorrer do tempo percebi
que algumas coisas eram impossíveis pra mim, tipo executar alguns movimentos de
kata apoiado somente na minha perna menor, pois o único modo de fazer algumas
dessas técnicas seria ficando na ponta do pé, o que me faria perder o
equilíbrio facilmente.
Com o tempo consegui executar
alguns desses movimentos, mas não tinham efeito além do visual, visto que não
havia base de apoio suficiente, meu corpo todo estava apoiado na ponta de meu
pé da perna deficiente. Outro fato é que se eu estivesse com a bota, jamais
conseguiria fazer esses movimentos que treinei descalço.
Fui me adaptando e caindo na real
que era impossível ser o lutador que sonhei, no máximo seria um artista marcial
mediano, já que meu corpo não permitia ser excepcional.
Treinávamos 3 horas diárias, era
muito puxado e no final das aulas todos estávamos exaustos. Foram anos e mais
anos treinando diariamente, se um aluno normal precisasse treinar um golpe 100
vezes para executá-lo da maneira correta, comigo seriam necessários 10 vezes
mais esforço, tempo e repetições nesse treinamento.
Aos poucos percebi que meus
golpes com a perna mais curta eram muito mais fracos que o normal, o impacto
dado por essa perna não era nem metade do impacto dado com uma perna normal,
por outro lado, a velocidade que eu desferia o golpe com essa perna era o dobro
da velocidade que alguém com a perna normal desferiria.
Outro fato é que meus golpes com
a perna boa eram muito fortes, porém, bem mais lentos que de uma pessoa normal.
Logo, usava a perna curta, que era bem mais rápida que o normal, como golpe
primário e a perna normal como golpe secundário ou final. Dessa forma fui
treinando e me adaptando, além de eliminar de vez as técnicas que por mais que
treinasse não conseguia executar.
Nessa época eu já sabia
claramente que para mim era impossível ser sensacional nas artes marciais, que
poderia treinar todos os dias pelo resto da minha vida que jamais atingiria as
minhas ambições de excelência.
Estava diante das duas únicas
opções que me restavam: continuar e ser um faixa preta mediano ou desistir e
esquecer esse assunto.
Continuei e, apesar das minhas
limitações, consegui ser faixa preta, não o faixa preta dos meus sonhos, mas o
sensei que deu para ser.
Em minha análise não contabilizo
essa minha luta como vitória, visto que minhas técnicas nunca chegaram nem
perto das minhas ambições, mas tá valendo.
Tive problemas também na
musculação, pratiquei por alguns anos e consegui modelar parcialmente meu
corpo. Digo parcialmente, pois alguns membros não se desenvolviam, por mais que
eu os forçasse, por exemplo a panturrilha da perna deficiente, a forcei por
anos e nunca engrossou.
No final concluí que minha
genética não é lá muito boa e, que, com essa minha deficiência, até que
consegui chegar longe, apesar de não ter ficado satisfeito.
Concluindo, descobri na prática, que
mesmo quando não podemos ser o melhor, podemos alcançar o melhor segundo as
nossas limitações.
O resto ficará para a próxima
encarnação, quem sabe renasço com um excelente “Avatar”, um corpo geneticamente
privilegiado na próxima?
Cláudio Nunes Horácio
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